Thursday, September 15, 2011

E os Habitantes de Lá? Vão para onde?

Carta aberta das comunidades ameaçadas de remoções: despejos e reintegrações de posse na cidade de São Paulo

Nunca o direito à moradia e o direito à inviolabilidade do domicilio foram tão desrespeitados

21/09/2011
Nós moradores de Favelas, Loteamentos Populares, Ocupações Irregulares de todas as regiões da Cidade São Paulo, cansados de um verdadeiro ataque da Prefeitura, do Governo do Estado e do setor imobiliário contra as nossas Comunidades, neste dia 20 de Setembro, decidimos sair às ruas para protestar contra as remoções, ações de reintegrações de posse que ameaçam milhares de pessoas em todas as regiões da cidade.
Para estas remoções ou despejos as razões diversas: Grandes obras como as Operações Urbanas, Parques Lineares, Construção de Túneis e Viadutos, Obras do Rodoanel, Projetos de Renovação Urbana, Obras do PAC, Ampliações Várias, Questões Ambientais, Grandes Obras de Infraestrutura e Saneamento (Projeto Defesa das Águas), Obras do Setor Privado como os Estádios para Copa do Mundo de 2014, e ainda remoções ou despejos para construção de imóveis de alta renda.
O fato concreto é que a cidade vive uma explosão de imobiliária de grandes de grandes projetos, parte deles com prazos para conclusão em 2014, coincidentemente na mesma época dos Jogos da Copa do Mundo em São Paulo. Outros projetos estão com conclusão prevista para depois de 2014. No entanto, o fato grave que chama atenção e indigna a todos nós é a enorme quantidade de remoções na cidade sem solução habitacional definitiva.
Nunca o direito à moradia e o direito à inviolabilidade do domicilio foram tão desrespeitados. Nas remoções, pessoas são arrancadas de suas casas e fotografadas contra sua vontade por agentes das empresas contratadas pela Prefeitura, os moradores são humilhados e intimidados. Há denúncias que jagunços armados ameaçam pessoas para que deixem suas casas, tudo com a conivência do poder público. Nestas Comunidades, casas são demolidas e os móveis são confiscados ou saqueados enquanto as pessoas estão trabalhando.
O mais grave é que este fenômeno é generalizado e vem ocorrendo em todas as regiões da cidade. Não raras vezes, a única sinalização do poder público é com carta de crédito da CDHU que não contempla a família, moradias de péssimas qualidades em outros municípios da região metropolitana, parceria social de 300 reais por mês, por 30 meses, uma ajuda de custo de 900 reais para pessoa se alojar em outro lugar e outras vezes nada, nenhum apoio. Lembramos que muitas destas Comunidades estão em áreas de Zeis, e por lei mereciam outro tratamento do Poder Publico.
Assim, diante desta grave situação exigimos:
• Fim das ações de remoções despejos forçados e fim das ameaças e humilhação contra os moradores das Comunidades;
• Construção de um processo de mediação para efetivar solução habitacional adequada para estas comunidades, com garantia da moradia digna nas regiões para todos os atingidos;
• Solicitamos ainda a atuação do Ministério Público e da Defensoria Pública para apurar as violações propondo medidas administrativas e judiciais cabíveis;
• Fim do cheque despejo, com garantia de projetos de urbanização e regularização fundiária;
• Fim da criminalização da pobreza dos movimentos sociais;
• Empenho de recursos equivalentes aos que serão gastos com a realização da Copa de 2014 para construção de moradia popular

UMM, MDF, CDHS, CMP, CGGDH, FLM, MMRC, MMC, ULC, Comitê Popular da Copa, Comitê Copa Pra Quem?, Pastoral da Moradia, Movimento Nossa Itaquera, Projeto Chão, Associação Estrela Guia, AMOPAZ, Movimento Sem Teto Zona Oeste e Noroeste, Movimento de Moradia da Região Sudeste, Associação dos Trabalhadores Sem Terra Leste-1, UMMIZS, Associações Pantanal e Jurubatuba, Associações da Região Butantã/Uirapuru/Vila Nova Esperança, Associação de Moradores da Vila Rubi, ACALeO, Movimento da Várzea e por Justiça no Processo de Desapropriação, Comunidades da Água Espraiada, Comunidades ameaçadas pela construção do Itaquerão, E.M.PUC/SP, Comunidades Atingidas pelo Rodoanel Trecho Norte e Pela Jacu Pêssego.

Saturday, September 10, 2011

O Corpo Teológico na Arte e Cultura

O amor: um mecanismo complexo
Por Danielle Greco

“De que vale estudar se o conhecimento não se transformar em amor?” Antônio de Pádua, filósofo do século XIII, iniciava todas as suas aulas com esta frase. Apaixonar-se por alguém, é mais poético do que apaixonar-se por uma poesia. Porém, isso apenas acontece com facilidade nos contos de fada, em histórias escritas, por pessoas buscando cada vez mais, o hedonismo, um amor incondicional que supre necessidades, o prazer de viver.

Amar é um verbo e não um sentimento, o amor, somos nós que escolhemos, se queremos vivê-lo ou não, quem amar e quem deixar de amar. É um livre arbítrio. A partir do momento que amamos, estamos escolhendo viver de determinada maneira com determinadas pessoas, e nos inserimos em um sistema. Este amor, não é incondicional - como o amor de Jesus Cristo por nós -, é condicional, pois todos os sistemas assim o são. Uma das regras do amar é se adequar ao sistema, onde muitas vezes, para isso, sofrem-se torturas e agressões.

O amor é um mecanismo complexo e se determina hoje, como pragmático em nossa sociedade, a lógica das idéias e atos de qualquer pessoa se determina como verdades apenas se estas servirem soluções imediatas de seus problemas, sem analisar suas conseqüências. 

Sunday, August 7, 2011

Um Deus que Dança

Eu acredito num Deus que dança.

Acredito que Ele balança ao som da melodia que criou. Que, trocando os pés, se equilibre sobre justiça e piedade.
Acredito num Deus que gira sobre o próprio eixo e então desloque lenta e firmemente para baixo de seus braços. Acredito que lance alto, num susto, e pegue em segurança antes de tocar o chão.
Acredito que Deus sorria enquanto a batida forte acelera, e se perguntam se serão capazes de continuar dançando.
Mas é Ele que conduz.
Acredito que Ele sempre sabe qual será o próximo passo, e que nunca perde o raciocínio de sua coreografia.
Acredito que Ele desliza sobre os joelhos no chão encerado dos pátios de marfim e ouro da eternidade, e que lance, abraçado, seu par sobre a terra batida de pó e cinzas diante de Seu gigantesco trono de Poder. Que troque as mãos, rindo, e sem perder a marcação, repete o passo quantas vezes quiser.
Acredito que ele conhece cada passo. Cada acorde. Cada parada. Ele conhece o ritmo, Ele conhece o ambiente, e mais do que tudo, Ele conhece quem conduz.
Ele toma pela mão quem escolhe nesse grande salão que Ele mesmo construiu, e nunca parou uma dança no meio.
E Ele é a estrela do dia.
Ele é a principal atração.
É dEle o show.
O maior dos Dançarinos.



promesse: Um Deus que dança.: "Eu acredito num Deus que dança. Acredito que Ele balança ao som da melodia que criou. Que, trocando os pés, se equilibre sobre justiça e pie..."

Monday, July 18, 2011

"Com Aquarela" em co-criação

Por Bruna Vitorino de Sousa

A obra sugere uma série de interpretações, uma delas pode ser a violência de se atirar e chocar contra o solo e reconstituir-se; como pode ser também a necessidade de esfacelar as camadas mais externas para se chegar mais próximo da sua essência.


A sala é preparada com a intenção de estimular a percepção do público para além da visual a que estamos habituados, incluindo também o tato e a audição. As cadeiras e colchonetes estão próximos da área escolhida para a movimentação, e as luzes estão apagadas ao ponto de não se conseguir enxergar as outras pessoas. Então, se ouve algo batendo contra a parede. Segundos depois, se percebe que esse algo que se choca é a própria artistas.


Em meio a tanta escuridão, sentimos a artista se atirar contra o solo, a parede, a desenhar e a escrever, mas a voz que ela emite, mesmo se movendo, traz outra impressão, a de que ela está no centro do espaço e os sons, causados pelos choques, são feitos por cascas que fazem parte dela e são jogadas, partes superficiais, como roupas vestidas uma sobre as outras e são despidas até que se chegue a ficar nu.


A voz na escuridão preenche o espaço e suas ondulações sugerem imagens da movimentação ao público, e também o guia neste caminho que busca a matéria primordial que a faz ser o que ela é. Essa matéria primordial não é a que conhecemos biologicamente como constituição, mas uma mais sutil, difícil de dimensionar, pois ela está em nós nas nossas escolhas, paixões, preferências, experiências vividas que nos distingue dos outros e torna cada um ser único.


Sunday, July 10, 2011

"Com Aquarela" em co-criação

A escrita é uma linguagem, pela qual impressões e construções são descritas, é também um espaço de diálogo entre artista e público, onde ambos constroem relações no tempo-espaço e no corpo-ambiente. 


Olá Dani!

Sabe quando você vai para um lugar sem ter muita idéia de como será? Assim fui eu.

E isto foi legal, pois tudo foi novidade, desde o começo até o final. Já começou com o fato da platéia fazer parte do palco. Estar sentado ali no meio, de onde você dançarina se movimentava, foi novidade para mim, foi diferente. E o escuro? Não fazia a mínima idéia de que seria assim. Foi surpreendente e enigmático para caramba! Rs.

Ai você começou dançar. Pensei: cadê a música? E nada da música, também nada de luz... Rs.

Os objetos no chão, as folhas em branco, lápis... outras folhas já desenhadas no espelho... Você movendo-se por todo espaço informe... trevas, silêncio absoluto...

Então vi que estava diante da representação do gênesis, da criação. A dança era linda...

O movimento sobre o plástico, representando o Espírito movendo-se sobre as águas...

Começa surgir luz...

Vem o sopro diante do espelho... sopro que dava vida, a criação segundo a sua própria imagem e semelhança.

Gostei muito dos momentos de dança diante do espelho, achei muito bonito, harmônico, simétrico...

As palavras que você dizia, eram reflexivas “Crescer, cultivar, aproximar, afastar, etc.”

“Você é responsável por aquilo que cativas”.

Outros questionamentos: “Quantos amigos você tem? Você tem cuidado deles? Ou você os tem mal tratado (foi super legal a representação arremessando as folhas).

Tem um momento que dá uma curiosidade geral, que é saber o que você escreve nas folhas... Aí você sai dançando, indo aos 4 cantos da sala, tive a impressão de representar levar as boas novas, o amor à todos os cantos do mundo...

"Com uma folha qualquer eu desenho um sol amarelo, com alguns traços eu faço um castelo"... O questionamento de o que estamos fazendo da nossa própria Aquarela?

Poucas vezes enquanto dançava você parou de frente e olhou nos olhos de quem estava lá... era só um olhar, mas que dizia muito.

Mais alguns passos e então o espetáculo termina; de uma forma serena e tranqüila...

Você disse que espera que eu tenha gostado? Pode ter certeza de que gostei muito, foi o tipo de arte que a gente vê e não se esquece mais.

Você quer que eu diga daquilo que não gostei? Impossível, não tem nada, nada, nada do que eu não tenha gostado. Foi tudo perfeito!

Tenho certeza que quando Deus olha e vê pessoas assim, como você, Ele fica bastante orgulhoso de sua criação.

Parabéns Dani, você é muito talentosa!

Bjs,
Eliezer

Sunday, June 19, 2011

Chamada Semana das Arte do Corpo

Um convite à todos!


Danço dia 28 de junho:

Às14h00 na sala 529: "Com Aquarela" e logo após, conversa com Ana Terra no Saguão do Tucarena

Às 19h20 no Tucarena: "EMFORMA"

Saturday, June 4, 2011

O maior no reino dos céus


Quando eu era uma pequena garota eu brincava e minhas brincadeiras não precisavam de muitas explicações. Minhas ações corporais não precisavam ser explicadas. Era curiosa e isso me transportava a outros lugares, pensamentos, sensações. Palavras eram ao acaso, dependiam dos momentos no espaço-tempo, de estados corporais próprios.

As crianças sempre foram consideradas pelos adultos como ignorantes, sem conhecimento, sem responsabilidades. Mas o que é mesmo o conhecimento? O que é ser responsável? Na verdade, os adultos não querem percebê-los e dar tempo às suas indagações, curiosidades, necessidades. Estão sempre muito ocupados em seus afazeres. São solitários.

Não há problemas no fazer e no ser solitário, a diferença está em estar em cada momento, aproveitar cada instante, cada pedaço de uma história que vai se construindo em uma trama de relacionamentos, com pessoas e com ambientes.

A criança, em seu planeta imaginário, simplesmente vive, se relaciona, sabe cativar, é capaz de estar presente em cada instante. Ela apenas faz. Ela apenas se diverte. Ela brinca. Ela dá risada. Nela se encontra a felicidade, que mesmo solitária, cuida de seu planeta e de tudo ao seu redor. Com muito carinho e atenção.

Os adultos são mais responsáveis que as crianças? Eles conhecem mais que as crianças? É como disse a personagem da raposa ao Pequeno Príncipe: “Você é responsável por aquilo que cativas.” E é como disse Jesus em Mateus 18:1-5: “... se vocês não se tornarem como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus.”

Wednesday, May 18, 2011

"Com Aquarela": processo de criação


A obra em questão busca diálogos entre desenhos produzidos por crianças após a experimentação em dança em exercícios de classe, e como o corpo na experiência artístico-educadora, organiza informações e sensações ao olhar tais desenhos durante a prática da improvisação. Há uma proposta de co-criação com o público, que também se arrisca em produzir desenhos a partir de sensações percebidas através dos estados corporais manifestados na obra.



 Cada retalho uma parte,
Cada parte um pedaço,


 Cada pedaço uma história,
Cada história um corpo,


 Cada corpo sensações,
Cada sensação momentos,


 Cada momento instantes,
Cada instante uma presença,


 Cada presença relações,


 No corpo, no espaço-tempo


Sunday, May 1, 2011

O Futuro do Cristianismo

Texto de J. B. Libanio publicado originalmente no site da Ultimato 


O Cristianismo retorna, de certo modo, a seus inícios históricos. Embora Jesus tenha sido camponês com toques de artesão de região rural, o Cristianismo, que surgiu depois de sua morte, assumiu caráter urbano. Difundiu-se principalmente nas cidades helenizadas. Depois da queda do Império romano e da conversão dos bárbaros, ruralizou-se e se configurou em esquemas institucionais típicos do mundo do campo. Nas últimas décadas, acelerou-se o processo de secularização e urbanização. O Cristianismo do futuro sobreviverá se responder às exigências e demandas da sociedade urbana e secular, perdendo a função hegemônica de configurar a sociedade a partir do próprio universo religioso. Termos que se imporão como desafio: declínio da força social da religião, secularização do horizonte religioso, horizontalização dos valores transcendentes, autonomia das realidades terrestres, privatização religiosa em face do Estado, dessacralização. Nada impedirá surtos opostos conservadores, mas sem perspectiva de marcar o porvir.
O Cristianismo do futuro sofrerá de crescentes incertezas. Perderá a homogeneidade dos dogmas e se esforçará por interpretá-los nos diversos contextos culturais, geográficos, étnicos, religiosos. Ele se entenderá histórico, contextual, plural. Assistirá ao ocaso da cultura ocidental, cartesianamente racional, capitalista neoliberal, burocrática, centrada no varão conquistador, de raça branca e de religião católica romana hegemônica para ver surgir novo paradigma com valorização da ecologia, da mulher, da diversidade racial, do diálogo intercultural e inter-religioso e da relação entre as pessoas e povos.
O futuro do Cristianismo já não dependerá do imaginário religioso que teceu ao longo dos séculos no Ocidente, mas antes da vitalidade interna que tem de inculturar-se em outros horizontes culturais. Tal processo não se fará sem muito sofrimento. A expressão católica ocidental se identificou de tal maneira com a fé que qualquer divergência séria cultural se considera heresia. O Ocidente se imbuiu abusivamente da consciência de possuir a única verdade católica. O futuro do Cristianismo aponta noutra direção: diálogo, pluralidade, liberdade criativa.
As linguagens sofrem duplo movimento oposto. De um lado, diversificam até o extremo. E, de outro, cria-se enorme homogeneidade pela via da globalização midiática. E o Cristianismo se percebe dilacerado entre as duas vertentes e corre o risco de rigidez que não aceita a linguagem globalizada nem a pluralidade. Isola-se, então, em pequenas ilhas culturais religiosas.
O ponto de contacto entre a linguagem da fé e o público passa pela experiência que se desgarrou de parâmetros rígidos e uniformes. O futuro desafia o Cristianismo para que ele se aproxime e converse com os excluídos, com o mundo da intimidade das pessoas, com as ciências e tecnologias de ponta, com as novas instituições sociais e políticas em gestação sob o nome de ONG, Fórum Social Mundial e outras. O Cristianismo perpetuar-se-á, não pela força da imposição, mas pelo diálogo e pela busca comum da verdade e do bem em vista de convivência humana e civilizada.
J. B. Libânio é padre jesuíta, escritor e teólogo. Ensina na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em Belo Horizonte, e é vice-pároco em Vespasiano

Tuesday, April 26, 2011

Cresci para me tornar criança

Por Camila Miranda


Quando a fala se torna algo proibido por, hipocritamente, desrespeitar o próximo, a escrita torna-se sacralizada. Se torna uma forma de escapar do real e mergulhar no poder incrível que a mente tem de imaginar. Uma válvula que relaxa os músculos e libera uma sensação de prazer inigualável.


É incrível que o fato de nos conectarmos com a nossa mente criativa, nos conectamos automaticamente com a nossa infância e, consequentemente, ao nosso Eu interior, portador de multifaces que compõem uma única. A criança tem a facilidade e a beleza de ser cem por cento imersa na considerada realidade e, ao mesmo tempo, no misterioso mundo da imaginação, cruzando e vivendo um e outro. Nós, seres humanos crescidos (vulgo adultos), esquecemos que um dia nossas vidas eram coloridas, apesar de qualquer escuridão. Esquecemos que brincar é saudável, e não infantil. Esquecemos, completamente, dos pequenos e significativos detalhes do mundo e da vida.


A criança sente prazer em respirar e descobrir que o ar entra e sai, simplesmente. A criança deslumbra ao observar o vôo de uma borboleta, ou a lerdeza de uma lesma no quintal de casa. A criança sente prazer pelos cheiros. O cheiro da chuva, do bolo de fim de tarde, ou daquela velha bola de plástico colorida. A sensação do sol que arde. A diversidade de cores e formas que possuem as flores. Uma poça d’água, um abraço, um olhar. Escolher o que brincar é a única preocupação, e ser feliz a única tarefa. Achar fascinante cada ser vivo, do jeito que é. Ser criança é aproveitar todos os segundos da vida do jeito que lhe convém. É não se preocupar apenas com a aparência, e não sofrer de doenças estéticas que assombram os seres adultos. Ser criança é ser portador de uma enorme simplicidade, e desejar somente sensações. Ser criança é saborear todos os sabores que existem no mundo. É ter o prazer de tomar um sorvete e, muitas vezes, odiar um vegetal. Ser criança é aprender brincando. É na infância que traçamos boa parte de nossas atitudes quando adultos. Esse pequenino ser é livre para correr, gritar, gargalhar, chorar, criar e aproveitar todos os minúsculos segundos da arte de viver. Por que quando crescemos, nos reprimimos a tal ponto que achamos tudo isso banal? Por que tantas e tantas crianças precisam sobreviver em situações deploráveis e massacrantes? Por que as formas de educar cada vez mais se baseiam em podar o poder criativo de uma mente infantil, para assim adequá-la a um sistema de sociedade fabricado, que consiste em não aguçar o ser pensante, e sim aflorar apenas o ser que produz em massa?


Que os detalhes da vida possam invadir, de novo, a nossa existência e que nós, seres humanos crescidos, possamos aliar a imaginação com essa realidade mundo a fora, turbulenta e muitas vezes fria e sombria. Que as crianças, enfim, ascendam nos adultos esquecidos, o verdadeiro significado de viver e ESTAR vivo.

Wednesday, April 13, 2011

O Corpo Cristão na Arte e Cultura

Por Danielle Greco

“De que vale estudar se o conhecimento não se transformar em amor?” Antônio de Pádua, filósofo do século XIII, iniciava todas as suas aulas com esta frase. Apaixonar-se por alguém, é mais poético do que apaixonar-se por uma poesia. Porém, isso apenas acontece com facilidade nos contos de fada, em histórias escritas, por escritores desiludidos, por pessoas buscando cada vez mais, o hedonismo, um amor incondicional.


Amar é um verbo e não um sentimento, o amor, somos nós quem escolhemos, se queremos vivê-lo ou não, quem amar e quem deixar de amar. É um livre arbítrio. A partir do momento que amamos, estamos escolhendo viver de determinada maneira com determinadas pessoas, e nos inserimos em um sistema. Este amor, não é incondicional - como o amor de Jesus Cristo por nós -, é condicional, pois todos os sistemas assim o são. Uma das regras do amar é se adequar ao sistema, onde muitas vezes, para isso, sofrem-se torturas e agressões. O amor é um mecanismo complexo e se determina hoje como pragmático em nossa sociedade.


Todo sistema tem uma história, uma memória interna, e a partir disso, este elabora decisões que favoreçam a sobrevivência dele. A busca de cada ser humano, por este amor hedônico, incondicional, sugere nucleação, pois o viver em grupo facilita a sobrevivência de uma espécie, assim as sociedades moldam as pessoas na busca por uma linearidade. A complexidade, a não linearidade dos sistemas, gera crise, gera seres agônicos e agressivos. A partir daí, constroem-se culturas.


A cultura nasce quando o ser humano toma consciência que vai morrer, ela resgata a humanidade, procurando uma permanência, e promovendo uma autopoiese, onde o próprio ser humano se autoproduz e autorregula, através das relações consigo mesmo, mantendo-se também em interação com o meio. Assim, o ser humano é regido pelos temas ontológicos de espaço, tempo, matéria e mudança, e havendo esta transformação, há evolução.


O conceito de evolução dentro dos sistemas, a evolução do conhecimento, a ontologia como ciência geral, ajudam a elaborar a complexidade do mundo. A cultura é como um sistema aberto, ela se interliga com outros sistemas, pode ser o todo e ter tudo dentro de si mesma e de suas propriedades, e o todo é sempre melhor que as partes, pois não se descobre o todo o decompondo. Na ontologia do holismo, o todo antecede a parte e o todo age sobre esta parte. Não há uma divisão entre corpo, ser humano, ambiente, sistemas.

“É que o mundo de fora também tem o seu ‘dentro’, daí a pergunta, daí os equívocos. O mundo de fora também é íntimo. Quem o trata com cerimônia e não o mistura a si mesmo não o vive, e é quem realmente o considera ‘estranho’ e ‘de fora’. A palavra dicotomia é uma das mais secas do dicionário.”
Clarice Lispector

Assim como o homem, o mundo e a cultura são imensos textos, sem decomposições e dicotomias. Mas, quem são seus editores?
         
De fato, o homem cria cultura sobre o mundo, esta se refere a suas próprias crenças, valores, comportamentos, regras morais e instituições, que, por sua vez, referem-se a identidades próprias, de determinados grupos, em um espaço-tempo. Com a não linearidade de hoje, a cultura também, pode se mostrar como uma contra cultura, esta acontece quando pessoas tentam mostrar uma cultura que se difere da maioria. A contra cultura, gera discriminação, é uma cultura não comum, como a arte contemporânea, que permite ao ser humano, explorar as diferentes possibilidades de uma realidade.
            
A realidade do século XX, é sistêmica, é complexa, é legaliforme, tudo que está nela, é sistema, nada é elementar, tudo se manifesta através de regularidades no tempo, ela independe do ser humano, o universo é um sistema mega, um todo indivisível e indizível.
      
Tentar lidar com a realidade, como ela pode ser, se traduz em uma ficção, e a sobrevivência está atrelada a capacidade de se pensar nesta ficção, mas isto apenas existe por causa de uma lei. E como podemos garantir que a lei do começo do universo é a mesma de agora? Qual a origem das leis? Nosso mundo é governado pelo caos determinista, nada funciona sempre do mesmo jeito, há uma imprevisibilidade, não se pode garantir que determinados eventos irão acontecer, são processos regidos por probabilidades, são leis estocásticas, e estas estão em grande número na natureza e na linguagem humana. Mas por que os ovos se transformam em pássaros, ou por que as frutas caem somente no outono?
           
Isto não é uma lei, pois não entendemos sua fórmula geral, não é uma necessidade, pois, embora, contemos com este tipo de acontecimento na prática, não temos o direito de dizer que ele sempre deve acontecer. Portanto, o mundo é gramatical, e o início do universo, é uma indeterminação matemática, o início existe, mas é desconhecido. Como surgiu o universo? O que é energia? O que é o ser humano? Qual nossa identidade?
          
É fato que, o homem sobre duas pernas, é algo exacerbadamente emocionante, e que, sua capacidade de criar cultura é inexplicável. Traçando este panorama, chega-se a teoria filosófica do monismo, o um, onde a realidade e identidade são inseparáveis. Um exemplo de monismo está no racionalista Spinoza, que defende a idéia de que, Deus e Natureza, são uma única substância, da qual deriva todo o universo, onde dois mundos paralelos, o físico e o mental, coexistem em uma só coisa.
         
Michelangelo em sua pintura sobre a criação do homem destaca o exato momento em que Deus despertou o homem a sua imagem, o corpo de Adão - que em hebraico se traduz por pó ou terra - deitado ao chão, como parte da natureza, com a mão esticada em direção ao céu, de onde Deus estende a mão para baixo. As mãos de Deus e de Adão não chegam a se tocar, uma brecha separa ambos os dedos, é como uma sinapse, por meio da qual flui a energia de Deus.
           
O livro bíblico de Gênesis denota que Adão já estava biologicamente vivo - dotado de corpo/mente - quando Deus lhe soprou nas narinas o fôlego de vida. Mas por que Deus não precisou soprar este mesmo fôlego nos animais que também já existiam? Isso é o que nos diferencia, a raça humana se tornou uma alma viva, e não apenas um corpo com vida, e o espírito/energia, revela esta substância única com que fomos criados, revela uma criação especial. O espírito é algo invisível, algo de que fomos formados no princípio e que temos como parte de nosso corpo. Somos únicos.
            
Assim, sendo o homem, dotado do racional - proveniente também deste espírito, pois Deus é razão, do subjetivo, e de uma realidade, material, visível, tangível e mortal, encaixa-se no termo “alma”. Em hebraico, né.fesh, ou, em grego, psy.khé, denomina-se como pessoa, animal ou, a vida que estes usufruem, suas necessidades de alimento, o próprio sangue em suas veias, seu ser com suas manifestações vitais, como a respiração, o eu consciente ou personalidade, como centro de emoções, desejos e afeições. Um ser vivente. E, sendo este ser vivente, a ordem dada por Deus a Adão era a de cultivar o solo, do latim, cultura. A identidade do homem estava formada.
    
Na sociologia, identidade é o compartilhar de várias ideias e ideais de um determinado grupo. Alguns autores, como Karl Mannheim, elaboram o conceito em que, o indivíduo forma sua personalidade, mas também a recebe do meio, onde realiza sua interação social.
    
Neste contexto, de universo, ser humano, identidade e cultura, entro na questão da religião no século XX, mais precisamente, da cristã, vulgo evangélico. Quanto a identidade cultural de cada individuo, quando cristãos, ela continua sendo a mesma?
     
Por que a necessidade de mudá-la? Talvez com a necessidade de adequar esta identidade a identidade de Cristo? Cristo tinha uma identidade, e ele não veio para que todos fossem como ele, mas sim, para que aprendêssemos a lidar com nossa própria identidade, que é singular e não plural. Veio nos ensinar a criar cultura, a lidar com o outro, a viver em sistemas abertos, a praticarmos um pouco mais do hedonismo.
           
Mas, os evangélicos - salvo exceções - são praticantes da contra cultura, são agônicos, apenas ‘pensam’ que são hedonistas, mas não, pois eles sempre afastam aqueles que não se encaixam em determinados perfis, ditados pelos maiorais. O acolhimento é condicional, não há coesão, e muito menos gratificação. Os identificados e gratificados são aqueles que partilham do sistema imposto. Há de fato um valor racionado, uma destruição de valores, para que todos tenham apenas um valor, e este valor engloba o sofrimento como ponto de partida. Não há democracia.
            
Dá-se importância a opinião de homens comuns, que mostram grande unanimidade quando com questões do dia-a-dia. A religião tem atuado como um taylorismo, tentando docilizar o corpo de pessoas, mantendo o pensamento bloqueado por questões doutrinárias e disciplinadoras. A regra do ‘não pode’, se corporifica em diversos ramos da sociedade religiosa, instaurando conceitos que estruturam o saber, o perceber, o se relacionar com o outro e com o mundo.
            
Neste aspecto, um corpo biopolítico - que exerce o poder - coloca a vida nua no centro de suas ações. As trocas propostas por tais conceitos/valores colocam os corpos, novamente, em uma linha de montagem da produção industrial, como propunha Frederick Taylor. O corpo religioso capitalista, viciado em práticas de inclusão para exclusão, ignora o pensamento, e conceitos que não estejam de acordo com os valores pré-estabelecidos por determinada liderança religiosa.
            
A negação do corpo físico; corpo este dado como o mal do ser humano; objetiva a tortura em “espetáculos” apresentados dentro das próprias igrejas e em intervenções urbanas, tornando todos, torturados e torturadores de si mesmo e dos outros; pois há sempre a identificação e a aceitação da tortura e do torturador, como se esta fosse a conduta correta.
            
E tudo isso se resume no valor. A condição humana vive este sistema, o líder sempre distribui os valores, e o outro, deve concordar ou discordar destes, definindo grupos, sistemas e culturas. Nos grupos, existem tradições, e não há acolhimento para aqueles que as quebram. O amor incondicional é apenas atributo daquele que percebe o outro como a si mesmo, e que decide não se render a determinados costumes e valores de massa. Deus criou o ser humano para viver o incondicional, mas infelizmente a evolução desejou o condicional, cumprindo o papel das escrituras.

 “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio "Dele", e sem Ele nada do que foi feito se fez. E o Verbo se fez carne e habitou entre nós...”
João 1:1, 3, 14
            
O amor incondicional esteve presente, e está presente e disponível àqueles que desejam acessar valores, e valorizar a relação com outro, promovendo um acolhimento incondicional de todas as culturas, coexistindo com diferenças, permitindo as diversas formas de se ‘cuidar do solo’.

Monday, March 14, 2011

Pelo Cine Belas Artes


Como o bom capitalismo brasileiro e o não a cultura, o Cine Belas Artes fecha nesta quinta-feira para dar lugar a uma loja...

E você, que é artista, ou que ama a arte, lote o Belas Artes neste último dia!

Convocamos todos para estarem e prestigiarem sua última mostra de filmes, as 13h30, antes de sua abertura.

Vamos mostrar que ainda existem pessoas preocupadas com a cultura e arte desta cidade.

Quem sabe alguém se dá conta de que não é apenas o capetalismo que impera hoje na sociedade.

E aqueles que não puderem ir, podem ir depois do trabalho, e se não puderem ir ainda, repasse o evento para sua lista de 1.737.877.886;997 amigos.

E mesmo que seja o último dia, vamos poder dizer que estivemos lá prestigiando seu fim!

Leve sua pipoca!!! Rsrsrsrs.

Friday, February 4, 2011

É Hora de Rasparmos a Tinta

Que todos possam perder (ganhar) um tempinho na leitura deste artigo. Creio que para um começo de ano é bom repensarmos quem somos, onde estamos, o que estamos fazendo. E como disse a amiga que o enviou-me: "Este texto é um Convite a Vida, a Liberdade, a Cristo. Um Convite à desconstrução acerca de Deus. Ótima semana de reflexão para todos." 

"O essencial é saber ver. Mas isso exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender. Procuro despir-me do que aprendi, procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram, e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos...” Volta-me à memória o meu amigo raspando a tinta das paredes da casa centenária que comprara, tantas tinham sido as demãos, cada morador a pintar de uma cor nova sobre a cor antiga. Mas ele a amou como uma namorada. Não queria pôr vestido novo sobre vestido velho. Queria vê-la nua. Foi necessário um longo strip tease, raspagens sucessivas, até que ela, nua, mostrasse seu corpo original: pinho de riga marfim com sinuosas listras marrom.

Nós. Casas. Vão-nos pintando pela vida afora até que memória não mais existe do nosso corpo original. O rosto? Perdido. Máscara de palavras. Quem somos? Não sabemos. Para saber é preciso esquecer, desaprender.

Segunda aranha, segundo fio, Bernardo Soares: nós só vemos aquilo que somos. Ingênuos, pensamos que os olhos são puros, dignos de confiança, que eles realmente vêem as coisas tais como elas são. Puro engano. Os olhos são pintores: eles pintam o mundo de fora com as cores que moram dentro deles. Olho luminoso vê mundo colorido; olho trevoso vê mundo negro.

Nem Deus escapou. Mistério tão grande que ninguém jamais viu, e até se interditou aos homens fazer sobre ele qualquer exercício de pintura, segundo mandamento, “não farás para ti imagem“, tendo sido proibido até, com pena de morte, que o seu próprio nome fosse pronunciado. Mas os homens desobedeceram. Desandaram a pintar o grande mistério como quem pinta casa. E a cada nova demão de tinta mais o mistério se parecia com as caras daqueles que o pintavam. Até que o mistério desapareceu, sumiu, foi esquecido, enterrado sob as montanhas de palavras que os homens empilharam sobre o seu vazio. Cada um pintou Deus do seu jeito. Disse Ângelus Silésius: o olho através do qual Deus me vê é o mesmo olho através do qual eu vejo Deus. E assim Deus virou vingador que administra um inferno, inimigo da vida que ordena a morte, eunuco que ordena a abstinência, juiz que condena, carrasco que mata, banqueiro que executa débitos, inquisidor que acende fogueiras, guerreiro que mata os inimigos, igualzinho aos pintores que o pintaram.

E aqui estamos nós diante desse mural milenar gigantesco onde foram pintados rostos que os religiosos dizem ser rostos de Deus. Cruz credo! Exorcizo. Deus não pode ser assim tão feio. Deus tem de ser bonito. Feio é o cremulhão, o cão, o coisa-ruim, o demo. Retratos de quem pintou, isso sim. Menos que caricatura. Caricatura tem parescença. Máscaras. Ídolos. Para se voltar a Deus é preciso esquecer, esquecer muito, desaprender o aprendido, raspar a tinta...

Os que não perderam a memória do mistério se horrorizaram diante dessa ousadia humana. Denunciaram. Houve um que gritou que Deus estava morto. Claro. Ele não conseguia encontrá-lo naquele quarto de horrores. Gritou que nós éramos os assassinos de Deus. Foi acusado de ateu. Mas o que ele queria, de verdade, era quebrar todas aquelas máscaras para poder de novo contemplar o mistério infinito. Outro que fez isso foi Jesus. “Ouvistes o que foi dito aos antigos; eu porém vos digo...“ O deus pintado nas paredes do templo não combinava com o deus que Jesus via. O deus sobre que ele falava era horrível às pessoas boas e defensoras dos bons costumes. Dizia que as meretrizes entrariam no Reino à frente dos religiosos. Que os beatos eram sepulcros caiados: por fora brancura, por dentro fedor. Que o amor valia mais do que a lei. Que as crianças são mais divinas que os adultos. Que Deus não precisa de lugares sagrados - cada ser humano é um altar, onde quer que esteja."

Por Rubem Alves